domingo, 25 de agosto de 2013

Capítulo 1 de Miosótis

   Já deveria ser cerca de sete horas da manhã e Jennifer não pensava em sair da cama assim tão cedo, mas tinha que fazer o mesmo. O ar frio e úmido invadia as cobertas. A mesma abriu um dos olhos, recebendo luz até demais de sua janela, fechou-o rapidamente.
   Abaixo das cobertas, não se via muito da jovem, era um amontoado de cabelo escuro, se escondendo da claridade da manhã. Você tem que levantar, meu bem, ela pensou como se falasse consigo mesma.
   - Não. – ela murmurou fechando mais ainda os olhos, mas sempre que ela dizia “não” era como se a sua própria decência a levantasse, seu subconsciente não a deixava desistir. Pelo menos não depois de tanto esforço.
   Jennifer usava uma calça de moletom, com meias grossas e uma leve blusa branca sobre o corpo. O frio, depois de tanto tempo, apenas roçava em sua pele. A mesma nem se importava ou coisa do gênero. Ainda com os olhos meio fechados, começou a se arrastar  saindo de seu quarto até o banheiro no fim do corredor. Antes de chegar ao mesmo parou em frente a uma porta antes da do banheiro e olhou pela fresta da porta, podendo ver sua mãe, jogada na cama.
   Por que ela pode e eu não? Ela pensou calmamente e depois novamente aquela pequena decência sua respondeu: Anda logo. E novamente começou sua marcha arrastada.
   No banheiro, viu seu reflexo no espelho e quis se internar, estava com cara de doente, na verdade, de uma morta-viva de filme de terror antigo. Os cabelos castanhos escuros sobre o rosto, mostrando apenas um dos olhos também escuros, com o rosto inchado com a sua cor de mel, bronzeada.
   Pegou seus cabelos longos e o jogou para trás e em seguida tacou a água gelada da pia em seu rosto, tendo como consequência o claro despertar de todo o seu corpo. Levantou o seu rosto, caçando a toalha e a passando no rosto.
   Pegou uma presilha de cabelo e amarrou no mesmo calmamente, fazendo um rabo de cavalo. Se olhou novamente no espelho e finalmente percebeu que algo faltava. Pós a mão esquerda no rosto e percebeu que estava sem os óculos. Voltou ao seu quarto e os pegou, os aros grandes e pretos.
   - Bem melhor – sussurrou.
   O seu quarto era pequeno, talvez por todos os livros a sua volta e a estante que guardava uma pequena metade, com uma cama de solteiro e um guarda-roupa simples, ao lado da cama, onde estava o seu óculos, havia uma mesa de cabeceira  Pegou o seu celular da mesma e viu a hora, marcavam exatamente sete horas e sete minutos. Alguém pensando em você, pensou Jennifer, ou não.
   Saiu do quarto e tentando fazer barulho para acordar sua mãe desceu a escada o mais rápido e saltitante possível. Chegou a cozinha, no primeiro andar e pôs água para ferver e em seguida ligou a televisão vendo os noticiários.
   - Você poderia ser menos barulhenta – escutou sua mãe gritando com a voz cansada. Ela sorriu e levantou os óculos, ajustando para seus olhos.
   As notícias eram as mesmas, morte, assassinato, acidentes e pessoas maravilhosas e famosas fazendo coisas igualmente maravilhosas. Ela perdeu o interesse rapidamente e subiu para o seu quarto. Na porta de seu guarda-roupa havia um espelho que não cobria todo o corpo, mas ajudava a escolher a roupa.
   Pegou uma calça jeans preta e uma blusa de uma banda qualquer e depois um suéter listrado, rosa e preto. Olhou a combinação e odiou totalmente.
   - Dane-se e junto que dane-se o banho. Está frio – ela riu consigo mesma e escutou a porta se abrindo atrás de si.
   - Eu vou fazer o café, não se preocupe.
   Jennifer olhou pelo espelho, o olhar de sua mãe era cansado, assim como o seu há alguns minutos atrás. Uma morta viva de um filme de terror. Ela sorriu para a mãe.
   - Hoje é seu grande dia, certo, querida? – ela sorriu, tentou, por que o sono parecia paralisar seu rosto. Jennifer assentiu e se olhou no espelho. Ela estava horrível, pelo menos, para ela. Em sua percepção, seu rosto era muito quadrado, seus lábios meio grandes demais, seu nariz estranho, seu cabelo era liso, mas bagunçado demais e seus olhos, escuros demais. Para ela, todas suas características eram exageradas demais, fazendo com que a própria se tornasse estranha demais, mas na verdade, ela chamava mais atenção do que percebia.
   - Sim, é.
   - Vou deixá-la se arrumar e descer para fazer o café. – viu sua mãe passar as mãos no cabelo suavemente, os abaixando e deixando seu belo rosto moreno e suave aparecer no espelho. Isso não ajuda, ela pensou, de morta viva à bela recém acordada. Sua mãe sumiu calmamente de sua frente e assim pensou: All Star, como sempre, sorriu e tratou de se despir, mesmo que fosse quase um desafio em meio ao ar úmido.

   Suspirou ao ver sua imagem no espelho de suéter e calça preta, além de seu all star de cano longo, também de cor preta. Se virou calmamente para a mesa de cabeceira e viu a corrente fina de ouro repousar sobre a mesma. Foi andando até ela e a agarrou.
   - Pai... – disse quase como uma lástima se recordando do mesmo. A corrente tinha um pequeno pingente de um pentagrama, o pôs e o repousou por debaixo da roupa. Estava pronta, pelo menos metade. Foi andando novamente até o banheiro, retirou a presilha de seu cabelo e começou a pentear o mesmo. Seu cabelo não era muito longo, ia pelo menos até um pouco abaixo da nuca, tinha uma leve ondulação e ainda usava uma franja de lado.
   Depois de talvez, umas poucas escovadas, o pôs novamente com um rabo de cabalo, mas desta vez trabalhando um pouco mais dele, fazendo uma pequena mecha surgir em cada lado. Escovou os dentes e sem se importar com algum tipo de maquiagem especial, desceu as escadas.
   A televisão ainda emitia o som de algum tipo de notícia local, mas a ignorou indo para a cozinha. Na mesma, sua mãe enchia duas canecas de café, das mesmas o vapor saia calmamente, Jennifer, já podia sentir não apenas o cheiro, mas o calor que poderia lhe proporcionar.
   Sua mãe, também prendera o cabelo, seus olhos eram escuros como o dela e seu cabelo negro, sempre dissera que Jenny puxara o cabelo do lado do seu pai da família. As linhas de seu rosto eram suaves e mesmo tendo trinta e sete anos, ainda tinha um rosto e corpo mais jovens do que a realidade, seu nome era Michele.
   - Então... – disse Michele agarrando a sua xícara e bebendo calmamente, desfrutando do sabor.
   - Eu vou para a colégio, finalmente pegar o meu diploma, depois vou para a casa de minhas tias. – ela sorriu.
   - Ainda não entendo por que não foi na formatura – os olhos negros de sua mãe alternavam de encarar seu rosto para a mão de sua filha tateando a mesa devagar até chegar a caneca verde e dar o primeiro gole.
   - Por que é contra os meus princípios  Garotas com belos vestidos e rapazes de smoking que provavelmente nunca mais irão se ver.
   - Por isso que fazem o baile e tudo mais, por que nunca mais se verão. – ela sorriu tristonha.
   - Não tenho ninguém que eu queira ver pela última vez. – ela pensou na sala do ensino médio que passara três anos e nos amigos que havia ganhado e perdido e assim por fim na sua única amiga de verdade que encontrara, Clara e de qualquer forma, se encontrariam dentro de horas, talvez, na mesma faculdade. – E também não tinha com quem ir para a formatura.
   Michele sorriu, um sorriso fraco e triste. Se lembrava que no colégio era uma das mais populares e talvez aquilo tivesse destruído muitas amizades, mas feitas diversas outras e achado a pessoa certa, o pai de Jennifer, que descansava agora em paz.
   - Não se preocupe, tenho dezoito anos e vou para faculdade. Encontrarei pessoas e finalmente sairei dessa cidadezinha. – ela riu se virando para ir a sala. “Finalmente a policia encontrou e prendeu o estuprador da cidade...” escutou atentamente, uma voz viril dizer estar palavras, mas depois ignorou.
   Pelo menos, minha mãe ficara bem quando eu for, Jenny pensou triste.
   - Aqui não é tão ruim.
   - Quando se encontra um emprego estável como a senhora fez. Todos aqui precisam de você.
   Michele era médica da pequena cidade, a mesma fria e triste na maioria das ocasiões  Para Jennifer, aquela cidade já estava formada, na verdade poderiam chamá-la de vila, todos se conheciam e haviam todos de importância  isto é, açougueiro, médico, dentista, não havia mais vaga para nada e quando alguém tentava surgir a mais, era um fato que sumiria em poucos dias.
   - Horas? – escutou a voz a mãe vindo logo atrás dela para a sala.
   - Devem ser sete e quinze.
   - Você vai agora?

   Ela nada disse, apenas assentiu triste, ambas sabiam que ela voltaria no mesmo dia, era uma visita, mas calmamente aquela visita se tornaria uma estadia por tempo indeterminado, ou talvez, sempre. Ambas sorriram e Jennifer sentiu aquele incômodo no estômago, ela chamava de pressentimento e sempre estava certo, a parte ruim era que na maioria das vezes, eram coisas ruins.

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